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A China e o Manhua

A cada dia mais a cultura asiática tem aumentado sua influência em outras culturas, seja em filmes, culinária, músicas, entre outras áreas.


Imagem retirada do manhua The Ravages of Time, baseado no 'Romance dos Três Reinos', um romance que detalha as façanhas de indivíduos influentes da história chinesa durante esse período de tempo.
Imagem retirada do manhua The Ravages of Time, baseado no 'Romance dos Três Reinos', um romance que detalha as façanhas de indivíduos influentes da história chinesa durante esse período.

As gerações anteriores tiveram o primeiro contato com a cultura asiática a partir de desenhos denominados Anime ou Tokusatsu, ambos oriundos do Japão. Hoje, com a internet o acesso a diversas informações é imediato, instantâneo e quase ilimitado, o que facilitou o encontro de pessoas de todo o globo com diversos conteúdos da cultura oriental, que é tão rica e diversa.


A maior parte do público que aprendeu a amar os desenhos orientais hoje em dia tem ciência que eles nasceram ou de uma Novel ou de um Mangá. As Novels são rápidas passagens lançadas periodicamente retratando uma história que em determinado momento somam o conteúdo de um livro. Assim são encadernadas e lançadas como uma obra completa. Esse conceito não é originalmente oriental, foi um gênero literário desenvolvido na Europa, muito popular na Itália e França. Os Mangás são obra ilustradas que podem adaptar histórias de uma Novel ou podem ser uma obra livre com história própria que levam consigo o estilo de ilustração asiático, que difere muito das nossas tirinhas ou das tão populares HQs.


Introdução feita hoje gostaria de falar sobre outro estilo de ilustração de origem também asiática que não é tão popular no ocidente quanto os citados anteriormente, o Manhua. Muitos podem achar que são iguais aos Mangás, mas há uma série de diferenças que vamos explorar neste artigo, a começar por sua origem.


A história do Manhua


O Manhua tem sua origem na China em meados de 1870 iniciando com algo que se assemelha às nossas “tirinhas” publicadas em revistas e jornais. A origem do seu nome tem tradução livre como “Desenhos Irresponsáveis”, porém o sentido correto é "História em Quadrinhos". Inicialmente as ilustrações eram utilizadas para promover marcas ou alguma informação de cunho politico. Nessa época a nomenclatura Manhua ainda não existia.

Os assuntos abordados eram diretamente afetados pelo regime imperial chinês classicamente rígido e regulatório. Este período é importante na história chinesa, pois começam a ganhar forças os movimentos revolucionários que se opõem ao regime atual e são incitados por ideias extremistas como o ultra nacionalismo e slogans como “os fins justificam os meios”, o que gera um maior receio sobre os conteúdos abordados pelos desenhistas.

A liderança Chinesa lutava para manter os ideais do Confucionismo que durante mais de duzentos anos regiram a moral, política, pedagogia e a religião do país e do outro lado os movimentos revolucionários se organizavam em protestos estudantis contra a influência do Japão e outras nações no território chinês. Uma grande virada vem no começo dos anos 20 quando é fundado o Partido Comunista Chinês (PCC) que inicialmente se denominava um grupo de estudo independente e usou isso para propagar ideais revolucionários através de seminários e literatura.


Neste mesmo período surgem os Lianhuanhua, predecessor do Manhua, que eram livros de bolso que contavam histórias de apenas uma edição, sem continuidade, acrescentando um gênero infantil às obras dos desenhistas e também materiais que apoiavam os ideais dos revolucionários.


Uma peça fundamental para o movimento revolucionário é Mao Tsé-Tung. Mao era uma peça importante do partido, tinha ideias mais extremistas e levou a uma “militarização” do partido, incitando a organização de milícias para controle de regiões fundamentais para a disseminação dos ideais revolucionários. O PCC estava presente no Kuomintang (KMT), fundado em 1927, que era uma organização criada pelos nacionalistas para centralizar o poder espalhados entre feudos e senhores locais, porém no mesmo ano todos comunistas foram expulsos do KMT, o que iniciou marchas das milícias armadas com Mao sendo nomeado comandante do agora exército vermelho. As atividades culturais neste período foram basicamente interrompidas no país devido à tensão politica e preocupação com a guerra civil que estava prestes a se iniciar.


Durante um período, houveram tomadas de territórios e conflitos basicamente isolados entre o PCC e KMT até que em 1937 começa a invasão japonesa, interrompendo a guerra civil e gerando até mesmo uma aliança entre os dois partidos um ano após a invasão. Isso deu força ao PCC, devido à brutalidade dos japoneses e a iniciativa de Mao a propor uma aliança, desta forma o alistamento do exército vermelho cresceu exponencialmente.


Apenas em 1946 a guerra civil é retomada e vai até 1949, quando os nacionalistas do KMT foram expulsos para Taiwan e lá decretaram um governo nacionalista na ilha com apoio dos EUA, que persiste até os dias de hoje.


Em 1954 após instituir uma nova Constituição, Mao se torna presidente da China e em 1966 e lidera a Revolução Cultural Chinesa, que visava eliminar qualquer traço capitalista na China. Isto resultou no pior revés da história moderna do país devido a massacres que resultaram em um numero incalculável de mortes, um declínio da economia e no recesso cultural devido ao extremismo do regime. Neste período os assuntos tratados nos Lianhuanhuas eram muito restritos, algumas obras com criticas ao regime político, romances impressos e até mesmo contos de cunho erótico eram distribuídos clandestinamente.


Hong Kong e a abertura cultural


Não se sabe ao certo em que momento os Lianhuanhua passaram a ser denominados com Manhua e seus criadores denominados como manhuajia o que é certo que uma grande reviravolta para o gênero foi a abertura cultural de Hong Kong nos anos cinquenta.


Com a eclosão da segunda guerra o Japão ocupou o território por quase quatro anos, porém após a rendição incondicional os britânicos passaram a comandar o território, mais uma vez tornando assim Hong Kong o maior porto de mercadorias no mundo, uma potência que gerou reação norte-americana, que usou como pretexto o regime comunista Chinês e a proximidade do território com o mesmo para boicotar suas atividades comerciais. Para combater o declínio Hong Kong promoveu desenvolvimento industrial e para isso buscou investidores e capital humano em outros países, com isso promovendo uma abertura cultural.


No ponto de vista dos Manhuas isso deu uma perspectiva totalmente nova aos seus autores que passaram a ter um contato direto com produções hollywoodianas e ilustrações ocidentais. Neste ponto começaram a ser lançadas obras com violência extrema e explícita, entre outros tipos de publicações que contrapunham totalmente as que eram reguladas pelo regime Chinês.


Em 1975 foi decretada a “Lei de Publicação Indecente” que decretava censuras aos Manhuas mais brandas que as adotadas na China, porém acabava com o extremismo trazido pelo ocidente às obras.


Diferente dos Mangás as obras publicadas na China são lidas da esquerda para a direita e são coloridas quase que em sua totalidade, assim trazendo mais detalhes às cenas e principalmente aos personagens. Até hoje os manhuajias chineses trabalham sob forte pressão da censura governamental, mas com o tempo se acostumaram a ir até o limite da censura em suas obras e esses limites a cada dia parecem ser maiores.


Tudo isso pode ser visto nos diálogos e ilustrações que passam determinadas ideias muito restritas no país sem que sejam totalmente explicitas aos leitores, ou seja, deixam muito para a imaginação do leitor.


Abaixo a indicação de ótimas obras para o conhecimento deste gênero ainda pouco explorado por nós ocidentais:

- Yao Shen JI (Tales of Demons and Gods) - Obra de Mad Snail
- Ayeshah’s Secret – Obra de Jing Zhang
- Their Story - Obra de Tan Jiu
- Zi Bu Yu - Obra de Xia Da
- A Garota da Noz de Areca – Obra de Lucas Paixão (brasileiro)
- The Beginning After the End – Obra de TurtleMe
- Tower of God – Obra de Slave In Utero
- The God of Highschool – Obra de Yongje Park
- Survival of the Sword King – Obra de Kwon Sun Kyu


Texto escrito por Henrique Cunha

Profissional de TI, formado em Análise e Desenvolvimento de Dados. É um curioso nato, amante de música, filmes e séries do universo geek. Colunista de variedades do Zero Águia.


 

Fontes:








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