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Pelé o Rei, Edson o ser humano

Quem viaja pela rodovia Fernão Dias, que liga São Paulo a Belo Horizonte, se depara ao chegar no trevo da cidade de Três Corações com uma estátua de cerca de 12 metros de altura. A estátua retrata um homem pulando e dando um "soco" no ar. A alusão que é feita pela imagem é a característica comemoração realizada pelo mais ilustre cidadão da cidade, Pelé, o Rei do futebol, ao realizar um gol.




A cidade com pouco mais de 80 mil habitantes homenageia, mesmo que de maneira singela, o atleta gigante que fez história e ficou conhecido mundialmente. Todos sabem que Pelé foi um dos maiores jogadores de futebol do mundo, uma lenda, que ao longo da sua carreira conquistou diversos prêmios, títulos e é considerado o maior atleta do século XX.


O Rei e a política


Ao olhar os feitos do icônico atleta não há quem não se admire com o que foi realizado por ele dentro do campo, os dribles, as jogadas, que entraram pra história e o consagraram como Rei do futebol. Ele conquistou o mundo e se tornou uma das pessoas mais conhecidas no século XX e até hoje. Quando Pelé visitou a Casa Branca enquanto jogava pelo New York Cosmos, Ronald Reagan, então Presidente Americano, declarou:


“Meu nome é Ronald Reagan, sou o Presidente dos Estados Unidos da América. Mas você não precisa se apresentar, porque todo mundo sabe quem é Pelé!”

Pelé ficou conhecido pela arte que construiu dentro do futebol. Porém, a imagem do atleta, do personagem criado dentro das quatro linhas, fica desfocado quando se sai delas.


Embora tenha visitado diversos Chefes de estados e ter recebido da Rainha Elizabeth II o título de "Sir", Pelé foi apontado e cobrado diversas vezes por não ter se posicionado politicamente de maneira aberta.


Pelé saiu do interior de Minas Gerais na década de 50 e foi para o Estado de São Paulo, onde descobriu seu talento com a bola. Foi durante o Regime Militar (1964 - 1985), que o atleta viveu o auge da sua carreira como atleta. Foi nos anos de 1960 que ele conquistou a maior parte dos seus títulos dentro do Santos, seu time de coração e onde viveu a maior parte da sua carreira.

Foi na Copa do Mundo no México, em 1970, que Pelé adentrou o vestiário gritando:

"Eu não morri!"

após a vitória de 4x0 contra a Itália, conquistando o tricampeonato.


Vale lembrar, que o tricampeonato no México ficou conhecido como a campanha dedicada ao Emílio Medici, então presidente brasileiro, durante a Ditadura Militar. Porém, não houve na época e nem tempos depois declarações do Rei Pelé sobre seu posicionamento político.


Ao ser cobrado mais uma vez sobre seu posicionamento, em entrevista para um documentário disponível em um serviço de Streaming, o Rei declarou "futebol e política não se misturam". Porém, infelizmente é necessário discordar da majestade do futebol nesse ponto.


Após o tricampeonato conquistado em 1970, o Rei Pelé deixou os gramados com a seleção brasileira, e há relatos de que ele e sua família foram perseguidos por ele não ter aceito participar da campanha de 1974, que aconteceu na então Alemanha Ocidental, onde o Brasil ficou em 10º lugar.


Além disso, vale lembrar que diversos colegas jogadores e técnicos de futebol se posicionaram politicamente dentro das quatro linhas do campo contra a Ditadura Militar e se empenharam a favor das Diretas Já!, trazendo o debate de fora dos estádios para dentro e causando influência fora dele, como já abordado aqui no Zero Águia, no texto Democracia Corinthiana - O Futebol contra a ditadura militar.


Fora das quatro linhas, o já consagrado Rei Pelé misturou política e futebol quando foi Ministro dos Esportes, entre 1995 e 1998, no Governo de Fernando Henrique Cardoso e foi um dos responsáveis pela criação da conhecida Lei Pelé, buscando maior transparência nas negociações entre atletas e clubes.

O Rei e o racismo


Em certa entrevista, Pelé declarou:

"É claro que existe racismo no Brasil, mas tive a sorte de ficar famoso e rico quando jovem, e as pessoas tratam você de maneira diferente quando você tem dinheiro e é uma celebridade. É quase como uma raça à parte – nem negra nem branca: famosa"

Na fala de Pelé não é levado em conta a questão sobre o racismo estrutural existente no país, sofrido por negros anônimos e mesmo celebridades como ele. Durante a Copa do Mundo de 1974, da qual não participou e já citada anteriormente. Pelé estrelou campanha internacional dos refrigerantes Pepsi.

A repercussão no Brasil foi negativa, onde publicitários e críticos alegaram que o lugar do Rei era dentro do campo e não como garoto propaganda. A possibilidade de ver Pelé, o Rei do futebol, estampado em outdoors, comerciais de TV e impresso em revistas era algo inaceitável, já que o espaço publicitário à época era dedicado e estrelado apenas por pessoas brancas.


Embora que de maneira orgânica, Pelé se tornou referência para diversos outros jovens negros que, assim como ele, sonhavam em jogar bola. Foi a partir da sua referência que diversos talentos se desenvolveram no futebol. Exemplos de talentos como Neymar e Robinho, também vindos do Santos Futebol Clube, tiveram no Rei Pelé a sua maior inspiração como jogador de futebol.


Edson Arantes do Nascimento


Filho de dona Maria Celeste Arantes do Nascimento e João Ramos do Nascimento. Edson Arantes do Nascimento foi uma criança pobre, mas não de situação miserável. Edson se tornou Pelé por uma brincadeira. Quando jovem no interior de São Paulo, era chamado de "Bilé" e devido a pronuncia de outras crianças virou Pelé.


O que era improvável para um garoto negro, ele conquistou. Conquistou títulos, a admiração e o respeito de todos em torno do mundo. O personagem Pelé, muitas das vezes se sobrepôs ao Edson, mas Edson era refletido nas atitudes Pelé.


Edson se envolveu em escândalos. Foi acusado de abandono parental pela ex-vereadora de Santos, Sandra Nascimento. Ela entrou na justiça pelo reconhecimento como filha. Porém, o que mais chamou a atenção foi que Edson nunca visitou a filha, mesmo ela estando no leito de morte, na luta que perdeu para um câncer de mama em 2006.


Além disso houveram escândalos sobre o filho Edinho, que foi preso por tráfico de drogas. Edson, pai, chegou a declarar que era uma maldição ter um filho no futebol profissional. Em seus relacionamentos Edson foi acusado de traições, como no namoro com Xuxa, que relata em sua biografia ter sentimentos antagônicos em relação ao ex-namorado, devido às inúmeras traições.

Edson, o rei Pelé e a lenda


Edson emprestou a Pelé todo seu talento e permitiu que fosse criado um ícone. Edson e Pelé construíram juntos um reinado de títulos, dribles, jogadas irreverentes e recordes.


Edson Arantes do Nascimento, o Pelé, o homem e o ser humano, está em cuidados paliativos, em decorrência de um câncer e tem recebido diversas homenagens ao longo da realização da Copa do Mundo no Catar.


Edson e Pelé construíram um Rei que serve de inspiração e referência para o mundo e principalmente para jovens negros, muitas das vezes pobres, que veem no Rei e no futebol uma possibilidade de mudança não só de vida, mas de mundo. Veem a possibilidade de lutar por uma sociedade mais justa e igualitária. Mesmo sem querer ou sem saber, Edson e Pelé, influenciaram toda uma sociedade.


Porém, o Rei Pelé, a lenda do futebol brasileiro, continuará vivo e inspirando pela eternidade.



Texto escrito por Felipe Bonsanto

Formado em Administração de empresas, pós-graduação em marketing e apaixonado por Los Hermanos. É militante pelos direitos LGBTQIAP+, trabalha com educação há oito anos, atua como co-host no podcast O Historiante e é colunista do Zero Águia.


 

Fontes










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